Robbie Jacks



Posso dizer que tudo nesta casa foi cuidadosamente pensado e planejado por mim. O banco em L contornando a sala, o rack rebaixado para comportar a vitrola, o porta-temperos logo ao lado do fogão, o armário barra bancada barra estante onde repousa este porta-retrato. O seu porta-retrato. 

Pai, era pra você estar aqui comigo. Seu banheiro está intacto, do jeito que você viu pela última vez, com aquela barra de metal que mandei instalar no chuveiro pra você não escorregar, lembra? 

No seu quarto, ainda não consegui mexer. Fui e voltei no design dos móveis, antecipando mil cenários onde você poderia precisar de mais espaço devido à sua doença. Você pediu para não instalar ventilador de teto por medo dele cair, então não coloquei. Você pediu pra não colocar TV no seu quarto, mas mandei instalar o suporte, vai que você muda de ideia? Sua cama, com um colchão nem muito macio, nem muito duro, ainda está envolta em um plástico. Está tudo do jeitinho que você queria, do jeito que a gente planejou. Só nunca passou pela minha cabeça que você não estaria aqui para tomar posse do nosso sonho.

Pai, beira o insuportável saber que você me ajudou a construir essa casa e não está aqui para desfrutá-la. Como é que pode uma coisa dessas, se você já conhecia todos os porteiros, ja era amigo dos meus pedreiros e vivia batendo papo com meu arquiteto? Eu nem sei como consegui vir pra cá sozinha. Você tinha que estar comigo. Era nosso plano, lembra?? Eu ia cuidar de você, e você ia cuidar de mim. Por que nosso plano não deu certo, pai? 

Não sei se foi o acaso, ou eu já estava imaginando o fim da minha felicidade, mas eu vivia registrando nossos momentos juntos, lembra? Coisas corriqueiras, como você descascando alho, ou me mandando “botar o boné” porque estava frio, ou nossas conversas matinais no meu quarto. 

Graças aos céus eu fiz essa foto sua aqui, na nossa nova casa, na primeira vez que pisamos nela juntos, lembra? Embora não seja o mesmo lugar onde você me criou e onde cuidei de você até o fim, ela está completamente tomada pela sua presença, pai. Eu fiz e faço questão disso. 

Me dói de gritar todas as vezes que acordo e lembro que você não está mais aqui. Mas sei que você batizou minha casa. Você esteve aqui desde o momento em que peguei as chaves, acompanhou cada perrengue, cada lajota colocada, cada eletrodoméstico que chegava. Esse novo lugar que vou aprender a chamar de meu lar. De nosso lar. Esse lugar onde você percebeu que poderia ir em paz, pai, porque sua filha estaria a salvo. 


Só que essa jornada, pai, está muito difícil. Por favor, não me abandona. Fica aqui comigo. O mundo já era assustador e solitário sem a mamãe, e agora eu me vejo completamente perdida. Eu queria dizer que vou ficar bem, com essa certeza que você tinha quando apertei sua mão pela última vez, mas não consigo. Nada nessa Terra mais faz sentido. Não sei quanto tempo consigo viver sem vocês dois. 
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