Robbie Jacks




Ele achou que valia a pena. Largou a família, os amigos, o emprego chato (mas ainda assim, estável e na área que ele gostava), as partidas de críquete e a terra onde sempre viveu. Apostou todas as suas fichas no amor e na sensação de felicidade que só os sonhos matutinos dos românticos conseguem emanar.

E aqui, na terra do bangue-bangue, do calor de 50º, da pobreza e do Carnaval, ele descobriu que viver de amor é muito mais poético do que prático. O dinheiro era curto, o idioma, um grande obstáculo, a dependência era sufocante e o amor, ué, onde ele foi parar?

Amigos, família e um trabalho que te deixe feliz não são bens que podem ser substituídos com a facilidade de quem troca uma escova de dentes. O amor é lindo e maravilhoso, mas meio burro e bastante etéreo: se perde fácil no meio de contas atrasadas, trabalhos estressantes, pressão nos estudos e ninguém para dividir seus problemas. Quem joga tudo para o alto em nome desse sentimento esquece que a vida é feita de muitos pilares, cujas bases devem ser muito fortes para que, caso uma ou outra se quebre, o prédio inteiro não venha abaixo.

Quem tem um amor, um amor grandão, daqueles que fazem doer, rir e chorar ao mesmo tempo, deve tentar sim ficar junto. Se vai valer a pena, eu sinceramente não sei, pois creio que só pode responder a essa questão quem tentou. O carinha da minha história, ao tomar a decisão, achou que valia a pena. O amor, infelizmente, sofreu demais por muito tempo, tendo uma morte lenta e dolorosa. Ou talvez não esteja de todo morto, apenas congelado em algum laboratório da vida, à espera do soro da Pedra Filosofal, ou do encontro do meio-termo entre as vidas tão diferentes. Mas será que agora, depois de tudo que passou, ele ainda acha que valeu a pena largar tudo por amor? Só ele pode responder...


Pauta para o TDB: vale a pena tudo por amor?



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Robbie Jacks




Acho que levo jeito com as palavras.

Adoro assistir a reality shows de competição, como Top Chef, Project Runway e Top Design. Mas, sempre que os competidores começam a colocar a "mão na massa/tesoura/tinta", eu me pergunto: meu Deus, COMO eles conseguem escolher no meio de milhões de possibilidades???

Não tenho a mínima idéia de como fazer roupas. Se me soltarem numa loja de tecidos, provavelmente vou sentar no chão, com 1 metro de fazenda, e ter um pequeno ataque histérico. São tantos panos, cortes e tendências que fico zonza.

Decorar minha futura casa também vai ser MEGA trabalhoso. Tábua corrida ou piso frio? Pátina na parede vermelha ou um espelho psicodélico? Que diabos é um cachepot e o que ele está fazendo no meu quarto???

Quando o negócio é cozinhar, aí é que eu congelo de fato. Ou melhor, DEScongelo. No microondas, de preferência. E, em mais ou menos dez minutos, meu almoço/jantar está pronto para ser degustado. Me perco de tal maneira na infinitude de temperos, ingredientes, molhos, modos de cozinhar, que nem um livro de receitas para dummies me salva.

Agora, com as palavras eu sei mexer. Diante delas, o mundo de possibilidades que se abre não me assusta, me encanta! A busca enervante por aquele termo que está "na ponta da língua", o conto que flui a partir de uma frase, uma lembrança, a sensação de eureka quando um texto sai no papel do jeitinho que o idealizei; tudo no processo de criação é maravilhoso. Até o "bloqueio mental", que às vezes me frustra a ponto de eu ter que mudar toda uma ideia, apagando e reescrevendo até que fique perfeita, ou a insônia do dia seguinte a uma noite particularmente produtiva, onde uma torrente de insights invade minha mente justamente quando meu corpo tenta relaxar, são preços ridiculosamente pequenos a pagar face à sensação de orgulho que sinto ao colocar o último ponto final em um texto trabalhoso.

Eu juro que gostaria de ser boa cozinheira, designer, ou decoradora. Mas acho que sou boa mesmo é com as palavras. Escrever não é meu trabalho, é meu idioma. E tenho muito orgulho disso.
Robbie Jacks

(a inspiração deste conto veio desta música linda de Alejandro Sanz & Shakira)

Sofia levantou-se, meio zonza, meio triste. A noite havia sido confusa, mas de nada lembrava. Seus olhos, ainda vermelhos de lágrimas e borrados da maquiagem pesada, vagaram pelo quarto. Tudo o que havia sobrado parecia estar no lugar. O teto em cima, o chão embaixo, a porta à esquerda e a janela à direita. Passado o torpor do primeiro piscar de olhos da manhã, Sofia se deu conta de que era ela quem estava deslocada. Seus ossos doíam, e, ao tentar levantar, uma dor lancinante na testa lhe obrigou a deitar-se mais uma vez, contorcida e amarga de uma ressaca mais física do que moral.

Com a dor ainda latejando em sua têmpora direita, olhou sua cama, e percebeu que estava vazia. Novamente. Será que ele realmente estivera ali? A noite havia sido tão insana, amigos, uma tequila, conversas, uma dose de whisky, risos, duas taças de vinho, um flerte, mais amigos, meia lata de energético e um pó estranho que, disseram, transformava rico em mendigo, preguiçoso em atleta. Tudo para esquecer aqueles olhos cor de fogo do dragão tatuado naquele braço que a envolvia por completo, protegendo-a dos dragões da vida real. Tudo, tudo, tudo caía no limbo entre a sensatez e o delírio quando saía com seus amigos.

No entanto, como pudera esquecer!, ali estava ele, forte como sempre, lindo como nunca. Sofia sentia que todos os drinks do bar não a fariam imaginar aquela silhueta máscula (e agora um tanto brilhante) desenhada pelas luzes neon no canto da pista de dança. O que ele estava fazendo ali? E estaria sozinho? Será que já estaria com outra? Sofia travou uma batalha mental por exatos dez segundos antes de partir, decidida, para cima dele. Se estivesse sozinho, pensou, será que ainda sentiria alguma coisa por ela?

Na pequena distância que separava o bar do canto esquerdo da pista de dança onde se encontrava seu ex, Sofia pensou no quão difícil estava sendo esquecê-lo. Os dias e as noites eram fisicamente computados por ela apenas pela execução de suas obrigações diárias, como trabalhar, jantar, levar Duke para passear. Em sua mente, no entanto, só havia um dia, ou melhor, fragmentos tão pequenos e tão similares que confundiam o calendário: como uma vitrola engasgada em um pedaço particularmente meloso de uma música de amor que estourou há 10 anos passados, Sofia se prendia loucamente aos momentos felizes que passou ao lado dele. Uma sequência de beijos apaixonados, danças, viagens, carinhos, e até as compras que faziam despretensiosamente no supermercado foram devidamente mixadas, glamourizadas e arquivadas na primeira prateleira de sua memória, ao alcance fácil do coração.

No meio dessa confusão de espectros felizes, toda a alegria se foi ou, como Sofia escreveu em sua agenda, "abriram o ralo da minha vida e todas as cores escoaram". Da casa que compraram e mobiliaram juntos, só restaram os móveis maiores, e as paredes nuas. Ah, e o cachorro. Aliás, o cachorro foi idéia dela, já que Sofia sempre morou em apartamento e nunca tinha tido a oportunidade de dar seu carinho a um bicho de estimação. Duke, por pura ironia, andava amuado e quase não comia, pois sempre havia sido mais apegado à ele. Sofia costumava achar graça da dedicação de Duke, sempre andando atrás do dono. Quando este se foi, Sofia percebeu que era Duke quem devia achar graça dela, que também vivia em função do ex-dono.

E ele, ao vê-la se aproximar, quase não acreditou. Por meses, havia tentado contactá-la, mas sem sucesso. Chegou a ir até o prédio onde trabalhava, mas Sofia se recusou a vê-lo. Talvez eu tenha esquecido de mencionar, mas Sofia era tudo, menos uma perdedora. Seu coração apertava como quisesse se enforcar em suas veias e artérias cada vez que pensava nele, mas Sofia era orgulhosa. Ele ainda veio com um papo de amizade, mas Sofia estava decidida. Se ele não a queria por inteiro, não teria nem a metade. E o ignorou completamente durante meses.

Mas ali, naquela luz que o deixava divino, com o nível de álcool acima do permitido a qualquer cidadão que não deseja ver o sol nascer quadrado, com a batida alta da música melosa de 10 anos atrás fazendo seu corpo pulsar involuntariamente, Sofia marchou com vontade para cima dele, postando-se a cinco centímetros daquele rosto que viu tantas vezes ao amanhecer, com os cabelos negros achatados e para cima, como se o travesseiro espertinho tivesse lhe dado um novo look moicano da noite para o dia. E aquelas linhas que se formavam pela expressão de seu sorriso já arriscavam aparecer mesmo em seu rosto sério. Sentia que os créditos não lhe haviam sido propriamente dados por aquelas marcas, já que tantos risos colocou naquela boca. Ai, aquela boca, sempre tão macia e convidativa, envolta pela barba, sempre por fazer, que fazia cócegas quando a beijava devagarinho, e esfolava seu rosto quando o clima esquentava...

Ele a olhou nos olhos e, por um minuto, foi como se nunca houvesse tido um fim. Beijaram-se como antes- os mesmos lábios, os mesmos movimentos, mas o antigo foi renovado pela excitação do esquecimento, e o resultado foi como se seus lábios nunca houvessem tocado. Seu hálito nunca esteve mais doce; o calor que subia seu corpo, nunca mais forte. Beijaram-se tanto que não se sabe como foram parar entre aquelas quatro paredes novamente. As paredes, que um dia testemunharam uma vida que se fluía junta, emoldurando o primeiro encontro, os aniversários, o dia em Paris, a noite em Santiago, tudo com o profissionalismo dos amadores da arte do Preto & Branco, agora eram cúmplices frias e silenciosas de um reencontro impetuoso e desajeitado que não devia acontecer. Até Duke, o cachorro, mesmo em toda a sua amargura, parecia sentir-se envergonhado, recusando-se a latir para o velho amigo que carregava sua dona pelo corredor, levando-a pelo labirinto da casa sem cerimônia nem hesitação para o quarto onde antes era feito amor. O que acontecia agora Duke não sabia, e o tamanho do bocejo que deixou à mostra os dentes afiados (que só mostravam sua bestialidade na bola colorida- presente da vovó) evidenciaram que ele, de fato, não se importava.

E Sofia, naquela manhã onde o Sol entrou pela janela pela primeira vez em meses, olhou para o lado e viu novamente seu outro travesseiro vazio, ainda com a marca (e com o cheiro, ah, o cheiro!) da cabeça de seu erro. Imaginou se seu cabelo ainda acordaria punk como nos velhos tempos. Velhos tempos. Tempos. Velhos.

Sofia se lembrou então de toda a dor que passou, de todas as vezes que acordou abraçada no travesseiro dele, inalando com fervor a fragrância que ele havia deixado para trás, fragrância essa que agora voltava a sentir, e que ficaria ali até o dia em que seu próprio cheiro dominaria novamente sua cama. Sua vida estava longe de ser ideal- ela ainda esperava um príncipe. No entanto, a claridade daquela manhã evidenciou o que não podia mais se esconder.


Suas resoluções foram interrompidas pelo aroma inebriante de café quentinho. É, Sofia também se esqueceu do café-da-manhã maravilhoso que ele costumava preparar. Antes, claro, das mentiras, das brigas e da solidão...

E lá vem ele, quarto adentro, com o café e o coração caprichosamente alinhados na bandeja. Oferece-lhe uma xícara, que ela sorve de bom grado. Passa manteiga em seu pão, que Sofia morde com gosto. Derrama mel em suas panquecas e em sua camisola, que faz Sofia sorrir, enquanto lambe dos dedos o excesso da delícia das abelhas. Por último, estende-lhe o coração, cuidadosamente envolto em desculpas e promessas de fidelidade e felicidade, ao que Sofia, com toda a educação que lhe foi dada, responde:

-Te lo agradezco, niño, pero no.

E o Sol brilhou mais forte.
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Robbie Jacks




Vou do céu ao inferno em um segundo. A cada momento, uma pergunta não respondida, uma armadilha vazia. Um falso alerta, numa manhã que desperta, onde o incerto me acerta: nem um sinal. A euforia de um novo dia tomada de assalto pela descoberta do velho, pela surpresa do comum: a euforia do mono-tom. E todos os dias, esse coração vive e morre, numa arritmia compassada aos passos lentos de uma marcha funesta rumo a onde jaz meu discernimento.

Meu coração me engana todos os sentidos. Sempre te sinto próximo e, quando olho, nada encontro. Meu coração engana minha boca, fazendo-me te chamar mais e mais, como se, à la BeetleJuice, a repetição de seu nome te conjurasse para perto.

Meu coração, tão vil e tão ingênuo, me engana a ponto de fingir que é amor essa dor que sente. Bobo e inútil, bate apenas para sustentar ilusões, imaginar castelos onde os olhos só veem tijolos. Aos olhos, aliás, só demandas lágrimas, punindo-os todos os dias por não cumprirem o teu desejo egoísta de encontrá-lo na multidão.

Quem foi o bastardo que te fez sensível assim? Sê ilha, sê rocha, sê qualquer coisa, mas sê eu de novo! Sou só coração, mas este coração já não é mais só, e muito menos meu. Deixou meu peito para se juntar a corações alheios que, muito ocupados com seus donos, não perceberam a petulância de seu tum-tum-tum distante e constante, que insiste em bater junto de quem não lhe dá abrigo.



É, eu estou muito mulherzinha hoje.
Robbie Jacks




A idade adulta às vezes me faz esquecer como as coisas mais simples da vida, como um banho de chuva, podem ser libertadoras. A primeira chuva do ano, dizem, tem o poder de renovação espiritual. Sentada na praia escura, na primeira noite de 2010, pensando na minha insignificância frente àquele mar de águas negras, percebi o quanto isto era verdade. A chuva que me molhou dos pés à cabeça mudou meu jeito de ver a vida. Não quero acreditar que essa chuva, que me trouxe algo de bom, levou tanta gente embora não muito longe dali. Não a minha Lluvia. Não mesmo.

O que aconteceu foi inesperado. Não teve clima, pergunta ou porquê: na infinitude de um segundo, senti seu rosto perto do meu. Vi, ao me virar, por trás de seus olhos baixos, a alusão de um sorriso. O assunto de antes me fugiu à mente. Nenhuma pergunta, nenhum porquê, nem um olhar: simplesmente aconteceu.

E os lábios, ao se encontrarem, foram umedecidos não pelo desejo, mas por um líquido ao mesmo tempo refrescante e estranho. À medida que os corpos se aproximavam, os céus pareciam clamar por parcimônia, aumentando em igual escala o ritmo de seu desague. O que era para separar, no entanto, acabou unindo mais, e a chuva se tornou parte de um momento que, sem ela, talvez não fosse tão especial. Sei que a fantasia do ideal me prega peças, mas tenho a liberdade dos escritores para dizer que aquela chuva não foi igual à nenhuma outra que já experimentei. La Lluvia, como gosto de me lembrar, só não foi papel principal pelo fato de um estranho ter me roubado um beijo e, com isso, a cena. La Lluvia fria e firme como um tapa do pai que desperta o filho para a vida veio para lavar minha alma, se misturar às lágrimas que derramei em 2009 e carregá-las para o mar, onde o vai e vem maternal das ondas acalentou e reaqueceu meu coração.


Ali, na beira do mar, as ondas quebravam suavemente em nossos pés, enquanto o tempo parava para que eu pudesse enxergar toda a grandiosidade da Lua como se fosse a primeira vez. Neste momento, quis ser como a ela que, embora o céu estivesse carregado de nuvens, se exibia, impassível e cheia de si, como se dissesse que nada, nem uma noite chuvosa, poderia atrapalhar seu brilho. E assim, em completo transe, eu falava abobrinhas, divagando sobre passados e futuros. Ele, por sua vez, me escutava pacientemente, talvez entediado, talvez confuso, parando aqui e ali apenas para oferecer um comentário, um sorriso, um carinho, tentando (em vão, posso adiantar) me garantir que as coisas das quais eu falava realmente tinham um propósito.

E assim minha virada foi feliz. Depois de um 2009 tão violento, tão difícil, fui encontrar meu otimismo, meu Recomeço, perdido no abraço molhado de lluvia de um estranho tão estranho que, do jeito que veio, se foi, assim como minha lluvia. Dois perfeitos estranhos. Dois estranhos perfeitos.


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