Sou graduada pelo ISERJ. Tenho outra graduação pela FACHA. Mas eu não seria quem sou hoje se não fosse pela UERJ.
Ela entrou em minha vida muito antes do vestibular. O ano era 1996 e eu, louca por artistas internacionais, enchia o saco da minha mãe para me ajudar na tradução de textos de revista e músicas. Ela, incapaz de conter o amor pela Língua Inglesa que corria no meu sangue e no dela, decretou: "se quer mesmo aprender Inglês, te boto num cursinho".
Quem olha de fora, talvez não entenda. É um prédio sem atrativos, alto e cinzento, sem o classicismo nem o requinte, e muito menos a modernidade de tantas outras universidades por aí. Mas esse primeiro contato com a UERJ foi surreal. Eu só tinha 14 anos e, de repente, já estava me metendo em aventuras além do meu bairrinho, expandindo minha pequena visão de mundo, que agora incluía o Maracanã e todas as vidas que eu via no caminho.
Todos os sábados, durante quatro anos, percorri aqueles corredores do 9º andar, repletos de gente de todos os tipos, classes e cores. Comi incontáveis joelhos quentinhos, daqueles que o queijo estica até tocar o queixo, fiz amizades com professores e alunos, trouxe amigos de fora para dentro e, conforme meu conhecimento crescia, meu amor por aquele bloco de concreto frio (e às vezes insuportavelmente quente) aumentava.
A UERJ me deu meu primeiro emprego, no mesmo cursinho de Inglês que acabara de terminar. A sensação de comandar uma sala de aula cheia de alunos com o dobro da minha idade foi surreal. Eu, verde que nem fruta no pé, suava frio nas primeiras aulas. Eram 4 horas de puro nervosismo, ainda sem jeito em ocupar uma nova função entre as mesmas quatro paredes. Mas peguei gosto por ver a sala sob um novo ângulo, e as paredes se afeiçoaram novamente a mim.
Corta para 1999. Recém-formada no Curso Normal, meu desejo número 1 era ser jornalista. Por um decreto do prefeito, tive que adiar o sonho, mas não perdi as esperanças: todos os anos, enquanto cursava Pedagogia, prestava vestibular para jornalismo. Passei para a PUC mas, mesmo com o desconto, não tinha dinheiro para as mensalidades. Ainda fiz mais um vestibular, sem sucesso.
Em 2003, já no final da primeira graduação, me preparei para mais uma bateria de provas. No entanto, ao examinar o folder de carreiras, percebi que havia um novo curso na UERJ: Inglês/Literaturas. Eu, que me recusava a cursar Letras por detestar gramática portuguesa, não pensei duas vezes e me inscrevi. E passei. E chorei como criança. E dediquei a vitória à minha mãe, que havia falecido um ano antes e não pôde me ver seguindo seus passos.
E foi durante essa graduação que me apaixonei de vez pela UERJ. Byron, Romans, Victorian Age, Celts, Jane Eyre, Stuart Hall, World War I, Bauman, tá todo mundo junto e misturado no meu coração, num grande MELTING POT que me fez entender por que minha mãe amava tanto essa língua.
Foram os quatro melhores anos acadêmicos da minha vida, estendidos por mais dois com o Mestrado, orientada por uma das melhores professoras que já tive o prazer de conhecer. Nesse meio tempo, ainda descolei um estágio, onde conheci muitos amigos que seguem comigo até hoje, e vivi histórias que dariam (e vão dar) um livro. E aprendi várias coisas, muitas mesmo.
Aprendi com quem ama o que faz. Aprendi a ser exigente comigo mesma. Aprendi a enxergar e respeitar as minorias, os queer, os LGBT. Aprendi a passar cola das maneiras mais inimagináveis (ei, eu sou Humanas, rs!). Aprendi a ler, a escrever, a interpretar, a compartilhar, a ouvir, a ser amiga e a fazer churrasco. Aprendi a transar.
Aprendi a valorizar os recursos humanos, que davam vida e movimento e cor ao prédio cinzento. Mesmo que os banheiros vivessem imundos e sem papel. Mesmo que as mesas dos professores estivessem carcomidas pelas traças. Mesmo que não houvesse um ventilador para arrefecer o calor do verão. Mesmo que o bebedouro jorrasse uma água amarelada e leitosa, que ninguém se atrevia a beber. Mesmo que a fortuna gasta em xerox não pudesse ser descontada no Imposto de Renda. Mesmo que a segurança fosse tão cagada que tínhamos que descer a rampa em grupo. Mesmo que as políticas injustas e mesquinhas dos políticos nos deixasse em casa por longos períodos de tempo, compensados justamente quando deveríamos estar tomando frozen margaritas no Havaí. Mesmo assim, a UERJ resistiu, porque nós estávamos lá dentro, agarrados às paredes, impedindo a erva daninha de se infiltrar pelas rachaduras, que não são poucas.
Infelizmente, não estou mais aí, mas carrego você comigo. Resista, UERJ! A batalha é de todos nós!