Robbie Jacks


Agora há pouco, meu pai me encontrou aos prantos, olhando para o celular. Em estado de alerta, papai arregalou os olhos e me puxou para o quarto dele, me perguntando o que havia acontecido. Eu não tinha ar nos pulmões pra explicar, então sentei na sua cama, chorando muito, olhando incrédula para o vídeo rolando no celular. Poc poc poc poc poc. Muita gente correndo e gritando. Pow pow pow pow pow. Pessoas se abaixam, algumas caem. Poc poc poc poc. Algumas não se levantam mais. Silêncio.
Ainda não estou acreditando que o lugar onde passei alguns dos melhores momentos da minha vida foi alvo de um massacre tão covarde.
Eu não tinha nada para amar num lugar conhecido como "Cidade do Pecado". Não que eu seja pudica, longe disso, mas o que a ideia de Vegas me oferecia não soava bem aos meus ouvidos. Não ligo para jogos de azar, não bebo até ver o fundo da garrafa nem sou de me render aos prazeres da carne nas várias boates de strip que dão fama ao lugar.
Mas Vegas me surpreendeu. Vegas me abraçou e me amou como uma amiga de infância. Tudo em Vegas é amistoso, até o diabo. Me senti acolhida, me senti livre, me senti verdadeiramente em casa.
Aí hoje acordo com uma notícia dessas. O maior massacre dos EUA acabou de acontecer naquela que já considero minha cidade. Os vídeos são de cortar o coração, de rasgar a alma e perder a fé na humanidade, vocês viram? Eu preferia não ter visto tão cruamente como a maldade humana pode se materializar de forma tão real.
Ainda não consegui digerir. Nem sei se vou. Tem uma grande poça de sangue no meu quintal. Eu vou e volto tentando imaginar como que um maluco resolve abrir a janela do seu quarto de hotel e fazer roleta-russa com as pessoas lá fora.
Gente que só queria se divertir.
Eu não tava lá hoje, esse massacre não é sobre mim, mas estive há uns ontens atrás. Essa história é sobre todos nós. Tenho amigos que acabaram de voltar de lá. Tenho amigos que estavam planejando ir pra lá. Meus artistas favoritos fazem residência lá. Tem muita gente boa que mora lá, ou passa por lá, ou foi só pra brincar e infelizmente perdeu a vida lá.
E agora?
Eu sei, eu sei. Limpa-se o sangue, enterra-se os mortos, cria-se um memorial às vítimas, artistas se manifestam e criam uma data para relembrar o massacre, discute-se um pouco a política de armas e saúde mental, só por conta do burburinho, mas nenhuma medida para melhorar uma e outra é efetivamente feita. E vida que segue.
Eu sei, isso aí tudo vai acontecer. E a gente vai ficar com medo de viajar pra lá e o raio cair novamente no mesmo lugar. Vai achar que tá mais seguro em casa, no meu caso, no Rio de Janeiro, cidade onde se mata mais do que na guerra da Síria. Porque a violência está em todo lugar. Tem gente ruim em todo lugar. Fazendo maldades o tempo todo.
Mas hoje é dia de lamentar por Las Vegas.
E eu ainda não consegui parar de chorar.
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